6 de julho de 2011

PENSAMENTOS INEXACTOS - CAP. X

PERDENDO-ME EM CONJECTURAS

Cortinas de fumo adensam-se ante os nossos olhos, nublando a visão, toldando o juízo, turvando tudo, enfarruscando até a clara compreensão. Pensamos certos, pensamos errados, em qualquer dos casos pensamos como dementes, principalmente quando não pensamos e apenas nos limitamos a aceitar os guias, julgando, no entanto, termos pensado, simplesmente por achamos que escolhemos.

Pensamos, por vezes, ver a enganação, mas na verdade somos aqueles com pedras nos olhos a tirar o pó nos dos outros, e agimos como os donos da verdade, quando na verdade nem estamos certos do que dizemos. Quantas vezes não nos retractámos?, e quantas vezes avançámos para logo a seguir marcharmos à ré? E ainda falamos da fé, criticando e empurrando os que não a têm, e da mesma maneira maltratando os que a têm mais do que nós. Quantas vezes não nos rimos de coisas que não compreendemos? Quantas vezes não respondemos com o irrisório ao absurdo? E quantas vezes não demos direcção errada  e não seguimos por ela orgulhosos demais para perguntar pela certa? E quantas vezes já não dissemos sermos melhores que o bom, e quantas vezes no passo seguinte declarámos o contrário, seguindo pelo oposto? E apesar de tudo isso, ainda usamos da palavra, dizendo sempre ter verdades, dizendo ter verdades únicas; travestimos as mentiras que nos obnubilam o juízo, vestimo-las de ilusórias verdades, usamos a lógica ou a religião, a cabeça ou o coração, misturamos a razão e a emoção, separamos a razão da emoção, e transformamos nossas verdades em não-relativas, mas universais, e condenamos e criticamos aqueles que pensam contrário. 

Mas mexendo em premissas, com silogismos dolosos, provo não existir a verdade, provo não existir a mentira, provo que a até mesmo a relatividade da verdade não existe, ou que é dúbia, ou que é falsa. Socrátes sabia tanto que não sabia o que sabia, mas se ele mesmo sabia que não sabia o que sabia como é que os sábios sabiam que Sócrates sabia? Ou os sábios não sabiam nada e na verdade Sócrates não sabia, ou o Sócrates sabia mesmo e os sábios sabiam errado. 

As verdades não podem ser totalmente verdades, na medida em que podem ser contestadas, será que porque isso acontece podemos dizer que as verdades são também mentiras? Pela dualidade dizemos que por existir o verdadeiro existe também o falso; mas o que é verdadeiro não pode ser falso, negação da contrariedade. 

O falso, no entanto, parece ser a garantia da nossa humanidade, afinal não é raro ouvir: errar é humano – humano, ser imperfeito, logo falso. Mas será que o erro é intrinsecamente ligado à falsidade? Nesse sentido, a verdade, a perfeição, não pode fazer parte da nossa natureza, porque com a verdade seríamos deuses, não admira que Cristo tenha dito: a verdade vos libertará. Contudo, nós nos guiamos pelo falso, aliás tomamos o conhecimento da verdade de uma mentira pelo falso nela existente. Ou seja, uma mentira é uma mentira, mas para ser mentira tem que existir a verdade de que ela é uma mentira, e essa verdade é provada pela falsidade existente na premissa, na inferência ou na conclusão dessa mentira. Talvez seja por isso que a nossa suprema falsidade nos tenha mostrado sempre o contrário do que Cristo disse, que a verdade não nos libertará, pois prendemos e matamos aqueles que têm alguma verdade para nos mostrar, porque nos incomodam, pois preferimos continuar na nossa zona de conforto, por mais ilusória que possamos descobrir que seja. Parece que odiamos a verdade. 

Jesus Cristo afirmou-se ser a verdade e foi morto; será que com a morte dele não terá morrido a verdade? Depende da religião. A verdade é universal? Supostamente sim. A ética é universal? Aristóteles dizia que sim, pois faz os direitos humanos; mas e a humanidade... a humanidade é universal? E então o humanismo? 

Não quero enganar a ninguém, por isso não tento enganar-me a mim mesmo em primeiro lugar; as interrogações lá atrás não são nem retóricas, nem mostras de preocupação, mas simplesmente o reflexo da frase de um sábio que disse algo como isto: sábio não é aquele que diz as respostas certas, mas o que faz as perguntas certas. Então faço perguntas para parecer sábio, faço perguntas para fingir que sei respostas, e que pretendo ensinar, mas não, não pretendo ensinar a ninguém, apenas a mim mesmo. Jogo tantas palavras no papel, concatenações de ideias sem sentido, porque estou a procurar uma luz e não sei onde, por isso não tenho um foco, vou apalpando com os pensamentos todos os assuntos que me propiciem uma reflexão, não procuro coerência na forma de raciocinar, apenas na exposição do raciocínio. Não sei onde está a verdade, mas quero saber identificar a mentira. Quais olhos devo então usar: os da emoção ou os da razão?
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